Eis que meu livro sorteado para o projeto Nobel de maio foi do vencedor do Nobel de Literatura em 1968, o japonês Yasunari Kawabata. Na verdade é minha segunda leitura do autor, a primeira foi "A casa das belas adormecidas" e eu também fiz uma postagem aqui no blog sobre as impressões de leitura, só clicar aqui para ler. Aliás, A Casa é um livro que divide opiniões, eu gostei na época mas acho que agora entendo algumas impressões diversas, principalmente depois da leitura de "O som da montanha".
A obra conta a história de Shingo Ogata, que já em uma idade avançada, sofre crises de perda de memória e vê-se diante de vários problemas familiares. Sua filha separa-se do marido e volta a morar em sua casa com duas crianças. Seu filho tem uma amante. O próprio Shingo no passado era apaixonado por uma moça mas acabou casando-se com a irmã dela. Olhando assim parece um belo melodrama, mas não, o realismo presente na obra é uma das características da escrita do autor.
"O som da montanha" é basicamente um retrato da vida cotidiana no Japão, ao final dos anos 60, em um período pós-guerra em que o país tentava renascer. Um paralelo com a luta diária de Shingo, que além de aprender a conviver com a velhice, tenta entender o colapso de sua família, enquanto nutre sentimentos pela sua nora Kikuko. E aí entram meus comentários sobre a semelhança com "A casa das belas adormecidas" e a estranheza que certos aspectos da história causa em alguns leitores, assim como causou em mim.
No decorrer da história, enquanto se compadece da sua nora que está sendo traída pelo marido, Shingo a trata com sentimentos exagerados, quase beirando a um relacionamento romântico. Sua justificativa (em pensamentos) é de que ela é muito parecida com seu amor da juventude, mas dá para perceber que ele também gosta de imaginar moças novas e paixões que já não consegue mais sentir, inclusive tem sonhos com isso. Em "A casa das belas adormecidas", o autor também insere um personagem de idade avançada em uma casa (bordel?) onde jovens moças, sob o efeito de entorpecentes, são observadas por homens como ele. Estranho né?
Eu concluí que alguns sentimentos inseridos nas histórias são inerentes ao autor. Sua vida foi cheia de perdas. A história de Kawabata começa com seu pai morrendo de tuberculose quando ele tinha dois anos. Logo depois perdeu sua mãe e sua irmã. Ainda jovem, perdeu o avô que o adotou. Dá para sentir nas suas obras que ele procura por figuras maternas, por amores impossíveis, por uma juventude feliz.
E através dessa análise, continuo gostando das obras do autor. Não podemos esquecer também da cultura japonesa, tão distante de nós ocidentais, que por si só nos causam estranheza. E na minha opinião, apesar da tristeza embutida nas histórias e de alguns hábitos grotescos, Kawabata mescla sensibilidade e poesia na sua maneira de escrever. "O som da montanha" nos faz lembrar os famosos haicais japoneses, dadas às constantes mudanças de estações inseridas na obra e metáforas com a natureza na descrição dos sentimentos.
Posso estranhar e não concordar com a maneira como a mulher foi colocada nos dois livros que li de Kawabata, mas não posso deixar de afirmar que ele tem um estilo único, que consegue inserir com maestria nos períodos vividos pela história do Japão e que não tem medo de juntar em suas obras o belo e o feio, construindo uma narrativa melancólica, porém poética.
Boa leitura!
Boa leitura!
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