Oi gente!
A
postagem de hoje é especial. Vamos falar sobre um conto de Machado de Assis,
que li para o projeto literário do Divã de Escrita e coincidiu com a temática
que estudei durante o mês de fevereiro (li o conto na edição da foto - "50 Contos de Machado de Assis", da Companhia das Letras). O plano inicial era gravar com o vídeo
do mês do Divã, mas decidi deixar minhas impressões do conto aqui no blog,
porque fica mais detalhado. Tenho outras coisas para falar no vídeo e dicas de
livros para mostrar, está programado para o próximo final de semana.
Então
começo com a coincidência que comentei. No mês de fevereiro me aprofundei um
pouco no estudo da escrita de diálogos. Li o “Como Escrever Diálogos”, da
autora Silvia Adela Kohan e um dos capítulos de “Para Ler Como um Escritor” da
Francine Prose era só sobre diálogos. Fiquei bem feliz quando percebi que o
conto “Teoria do Medalhão” de Machado de Assis, escolhido para um dos meses do
projeto, era composto de um diálogo entre pai e filho, sem narrador. Maravilha
não? O universo da Literatura conspirando a favor de quem estuda. =)
O conto “Teoria
do Medalhão foi publicado pela primeira vez na Gazeta de Notícias, em 1881.
Depois foi integrado ao livro “Papéis Avulsos”, uma coletânea de contos do
autor. Machado de Assis construiu muitos personagens que se acham intelectuais,
mas que no fundo são perfeitos idiotas. Ele fazia isso para inserir sua crítica
social, mostrando a intelectualidade medíocre dos brasileiros da época. Com o conto
“Teoria do Medalhão” não foi diferente. O diferencial é que ele conseguiu fazer
isso inserindo todas as ideias em um diálogo entre pai e filho.
Após o
jantar de aniversário em que o filho completa sua maioridade (21 anos), seu pai
inicia com ele uma conversa de aconselhamento. Os conselhos? Basicamente servem
para que o filho alcance prestígio em uma sociedade que vive de aparências. Claro
que com todo o cinismo, humor e ironia que Machado, apresentando-se como
escritor realista na época, sabia muito bem como escrever. Então ele inicia a
conversa dizendo que, mesmo que o filho conquista um diploma e uma carreira
profissional, gostaria que realizasse seu sonho: se tornar um Medalhão. Para
ele significava um homem chegando à maturidade após adquirir fama na sociedade.
Imagine
um pai aconselhando o filho a abster-se de ideias próprias e evita-las exercendo
atividades como jogos de bilhar. Ou seja, o mesmo que em pleno século XXI,
dizer: - Filho, não leia tantos livros que te fazem pensar, se previna gastando
seu tempo com realities shows na TV! Ou então: - Esteja sempre acompanhado
porque a solidão dá margens a ideias! Ou pior (e essa é do Machado adaptada por
mim): - Se for a uma livraria, vá só para bater papo ou contar piadas, isso vai
ajudar a reduzir seu intelecto.
E por aí
vai o conto. O pai ensinando algumas citações que o filho pode empregar em discursos
prontos, como fazer marketing pessoal sem esforço intelectual ou como entrar na
política da forma mais neutra possível, sem adotar novas ideias e apenas
discursar sobre assuntos que incitem discussões e debates. Sem imaginação, sem
reflexão, sem filosofia. Até na área do humor ele arrisca uns conselhos
escrupulosos.
“Teoria
do Medalhão” é desenvolvida em forma de crítica em torno do comportamento de
alguns membros da sociedade, em uma época em que no Brasil ainda imperava uma
economia agrícola, com o Rio de Janeiro como principal exportador de café. As
falas do pai são uma ironia direta aos que prezam o parecer acima de ser e que
obtêm ascensão social sem nada de esforço.
Ao ler os
conselhos do pai, conseguimos identificar como são construídos os “medalhões”,
que esquecem sua essência para viverem de aparência. Afinal, um medalhão não é
isso? Tem um belo, adornado, reluzente, visto e admirado por todos, e outro
oculto, sem nenhum atrativo e que fica sempre virado para dentro.
“Teoria
do Medalhão” é um conto satírico, muito bem escrito no formato de um diálogo,
contendo todos os ingredientes da estética machadiana, que nos permite uma
reflexão sobre a mediocridade da sociedade brasileira da época (porém um conto
atemporal!). A propósito, preciso ler Voltaire, pois me contaram que seus escritos
contêm essa ironia filosófica que pode ter inspirado Machado de Assis.
Boa
leitura!
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